domingo, 22 de maio de 2011

PMEs ainda distantes do IFRS

A adoção das normas contábeis internacionais pelas empresas de pequeno e médio portes (PMEs) ainda está distante da prática de seu dia a dia. Representando cerca de 350 mil negócios em todo o País, segundo cifra do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) –, as PMEs enfrentam não só o desconhecimento da regra como também a falta de capacitação dos milhares de profissionais de pequenos escritórios de contabilidade nesse processo. Com o vencimento do prazo para a adequação às normas – dezembro de 2010 – o pisca-alerta dessas empresas já está ligado.
“Algumas empresas estão mais preocupadas e já começaram a espelhar, em seus balanços, as novas normas. Mas a grande maioria vai realmente começar a trabalhar nessa direção agora, o que é preocupante”, afirma o sócio de Auditoria da Ernst & Young Terco, Daniel Maranhão. Ao se fazer um retrospecto do cronograma, o prazo para que essas empresas se adequassem ao novo padrão, realmente, parece curto em relação ao que tiveram direito as empresas de capital aberto ou aquelas com receita bruta anual superior a R$ 300 milhões ou ativos totais superiores a R$ 240 milhões.
Afinal, a Lei 11.638 – que explicava a chegada do padrão internacional para as empresas S.A. e as demais elegíveis para fazer a adoção – promulgada pelo Governo em dezembro de 2007. Já o Pronunciamento Técnico PME – Contabilidade para Pequenas e Médias Empresas foi emitido pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis em dezembro de 2009.
A comparação, apesar de parecer bem fundamentada, deve levar em conta também outros fatores. Segundo a gerente sênior do time de IFRS da Ernst & Young Terco, Fernanda Albuquerque, apesar do menor prazo, o grau de dificuldade para aplicação da norma nas empresas pequenas e médias também é menor. “São os dois lados da moeda. O ponto favorável é a adoção de normas mais simples, enquanto o negativo é a falta de estrutura que detêm para preparar as divulgações”, avalia Fernanda.
O fator crucial, no entanto, reside mesmo é na falta de estrutura interna e de conhecimento técnico nas empresas para adequar-se às novas normas que, entre outros pontos, exigem o reporte de informações contábeis. E, dependendo do segmento de atuação dessas empresas, o impacto na adoção das novas normas pode ter maior ou menor complexidade. “A partir de agora, elas passam a ser obrigadas a estruturar seus balanços obedecendo a padrões mais rígidos de divulgação, o que é uma mudança cultural profunda”, comenta o sócio Daniel Maranhão.
Um ponto positivo para as PMEs é que, enquanto as normas completas de IFRS são atualizadas anualmente, o modelo simplificado só ganha alterações a cada três anos, o que simplifica a vida do contador.
Exatamente pela mudança que representa a adoção do padrão IFRS pelas pequenas e médias empresas deve ocorrer de forma gradual. É o que avalia o vice-presidente técnico do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Nelson Mitimasa Jinzenji, segundo o qual, apesar do prazo de dezembro de 2010, não é surpresa o fato de que a adoção integral não será atingida por todas as empresas neste ano.
O prazo de início de aplicação, pelas PMEs, do padrão IFRS, corresponde ao exercício social iniciado em 2010. Como em toda alteração, especialmente naquelas em que há necessidade de capacitar os agentes que irão promovê-la, já existe a consciência de que a adoção integral não será atingida por todas as empresas em 2010. Essa adoção integral somente será conseguida paulatinamente”, argumenta o executivo do CFC.
E, nesse caso, haverá punições? Segundo Nelson, os contadores poderão ser penalizados pelo não cumprimento da norma contábil – mas as empresas, não. “O que poderá acontecer, nesse caso, é os integrantes dos conselhos federal e regional de contabilidade constatarem a não aplicação integral do IFRS e orientarem o profissional de contabilidade no sentido de que essa aplicação seja efetuada dentro de um determinado prazo. Concluído esse prazo, o profissional estará sujeito às penalidades previstas em lei”, diz o vice-presidente. Vale lembrar que, em casos extremos, a punição pode chegar à cassação do registro de contador, impossibilitando o profissional de exercer a atividade.
Nessa linha, bancos e instituições financeiras poderão ser úteis para auxiliar os órgãos de contabilidade no processo de fiscalização. Isso porque, ao ter acesso irrestrito aos balanços contábeis em IFRS das PMEs, as instituições financeiras terão à disposição as informações de que precisam para estabelecer seus termos de empréstimos e taxas de juros. Ao ter em mãos uma radiografia da empresa, o banco conhece o risco do empréstimo que está prestes a conceder e, desta forma, tem a possibilidade de calcular com maior clareza a taxa de juros que deve embutir naquele financiamento. Como não existe um órgão para fiscalizar o processo de migração das PMEs para o IFRS, a expectativa do mercado é que exista uma fiscalização indireta, como a dos bancos. “Afinal, o benefício da transparência que é esperada com a chegada dessas novas normas é bom não só para os investidores, como também para os demais stakeholders, como os bancos”, diz o sócio de Auditoria, Daniel Maranhão.
Além de resultar em mais transparência nos balanços, a chegada do IFRS ao País deve mudar o cenário profissional dos profissionais de contabilidade. “Historicamente, a contabilidade era vista como uma profissão muito pouco sofisticada e mal remunerada. Com a chegada do padrão internacional, essa realidade tende a mudar e se aproximar do que acontece nos Estados Unidos e países da Europa, onde os profissionais são muito respeitados e mais bem remunerados”, analisa a gerente sênior Fernanda Albuquerque.
Mas, para subir nesse patamar, esses profissionais terão de ganhar conhecimento. “Uma diferença será o aprendizado da língua inglesa, que é fundamental para saber o que está sendo discutido nos órgãos internacionais que publicam as normas IFRS, como o IFRS Interpretations Committee [Comitê de Interpretação das normas IFRS] e o International Accounting Standards Board (IASB). Quem quiser acompanhar a profissão de perto vai ter de começar a trabalhar pesado”, diz Fernanda.
Para auxiliar na capacitação desses profissionais, o vice-presidente Técnico do CFC explica que o órgão tem programado cursos visando aprimorar o conhecimento dos contadores. “Os que passarem por esse aprendizado deverão servir como disseminadores do conhecimento adquirido a fim de que um maior número de profissionais possa ser capacitado a atender a nova norma contábil”, conclui.

FONTE: Pgs. 14 e 15